O acórdão analisou o alcance da competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar controvérsias acerca de contratos de representação comercial, relativas ao pagamento de comissões.
AÇÃO
RE 6066003
TESE
“Preenchidos os requisitos dispostos na Lei 4.886/65, compete à Justiça Comum o julgamento de processos envolvendo relação jurídica entre representante e representada comerciais, uma vez que não há relação de trabalho entre as partes”.
ANDAMENTO
Baixa definitiva dos autos
RELATOR
Ministro Marco Aurélio
PARTE RECLAMANTE
FERTICRUZ Comércio e Representações LTDA
EMENTA
“DIREITO CONSTITUCIONAL E DO TRABALHO. REPERCUSSÃO GERAL. CONTRATO DE REPRESENTAÇÃO COMERCIAL AUTÔNOMA, REGIDO PELA LEI nº 4.886/65. NÃO CONFIGURAÇÃO DE RELAÇÃO DE TRABALHO PREVISTA NO ART. 114, CF.”
OBJETO
Alcance da competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar controvérsias sobre contratos de representação comercial, relativas ao pagamento de comissões.
APENSADAS POR PREVENÇÃO
ADI 492; ADI 3.395; ADPF 324; ADC 48; CC 7.204; CC 7.950; CC 96.851; CC 117.257; CC 91.041; CC 90844.
PRINCIPAIS ATOS E PEÇAS DECISÓRIAS
ANDAMENTO COMPLETO
TERMO DE BAIXA
CERTIDÃO DE TRÂNSITO EM JULGADO
ACÓRDÃO DE INTEIRO TEOR
DECISÃO DE JULGAMENTO, EM 28.09.2020
DESPACHO JULGAMENTO VIRTUAL EXCEPCIONALIDADE, EM 09.09.2020
DECISÃO MONOCRÁTICA SOBRE APRESENTAÇÃO DE PEÇA POR TERCEIRO-DEVOLUÇÃO, EM 30.09.2020
DECISÃO MONOCRÁTICA SOBRE AUSÊNCIA DE PEÇA, EM 06.09.2019
DESPACHO, EM 23.03.2017
DECISÃO MONOCRÁTICA, EM 10.09.2014
FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO
(os fundamentos ora apresentados correspondem na íntegra ao resumo do acórdão)
Recurso Extraordinário interposto contra decisão proferida pelo Tribunal Superior do Trabalho, em que se alega afronta ao art. 114, incisos I e IX, da Constituição Federal, com redação dada pela EC 45/2004. Na origem, cuida-se de ação de cobrança de comissões sobre vendas decorrentes de contrato de representação comercial autônoma, ajuizada pelo representante, pessoa física, em face do representado.
As atividades de representação comercial autônoma configuram contrato típico de natureza comercial, disciplinado pela Lei nº 4.886/65, a qual prevê (i) o exercício da representação por pessoa jurídica ou pessoa física, sem relação de emprego, que desempenha, em caráter não eventual por conta de uma ou mais pessoas, a mediação para a realização de negócios mercantis e (ii) a competência da Justiça comum para o julgamento das controvérsias que surgirem entre representante e representado.
Na atividade de representação comercial autônoma, inexiste entre as partes vínculo de emprego ou relação de trabalho, mas relação comercial regida por legislação especial (Lei n° 4.886/65). Por conseguinte, a situação não foi afetada pelas alterações introduzidas pela EC n° 45/2004, que versa sobre hipótese distinta ao tratar da relação de trabalho no art. 114 da Constituição.
A proteção constitucional ao trabalho não impõe que toda e qualquer relação entre o contratante de um serviço e o seu prestador seja protegida por meio da relação de trabalho (CF/1988, art. 7º). Precedentes.
Ademais, os autos tratam de pedido de pagamento de comissões atrasadas. O pedido e a causa de pedir não têm natureza trabalhista, a reforçar a competência do Juízo Comum para o julgamento da demanda.
Recurso extraordinário a que se dá provimento, para assentar a competência da Justiça comum, com a fixação da seguinte tese: "Preenchidos os requisitos dispostos na Lei n° 4.886/65, compete à Justiça Comum o julgamento de processos envolvendo relação jurídica entre representante e representada comerciais, uma vez que não há relação de trabalho entre as partes".
FUNDAMENTOS DO VOTO DO MIN. MARCO AURÉLIO
A EC n° 45/2004 ampliou a competência da Justiça do Trabalho, à qual passou a competir também controvérsias decorrentes da relação de trabalho - mais abrangente que a relação de emprego -, nos termos do art. 114, IX, da CF.
As controvérsias que envolvem representantes comerciais resultam, indiretamente, da relação de trabalho, de modo que a elas se aplica a EC n° 45/2004.
O recorrente, ao argumentar a prevalência do art. 39 da Lei n° 4.886/65, sobrepõe a lei infraconstitucional à EC n° 45/2004, referente ao art. 114 da Constituição, lei maior do ordenamento jurídico.
Não há violação ao art. 5°, LIII e LXXVIII, da CF, uma vez que a competência é da Justiça do Trabalho.
Desprovimento do RE por competir à Justiça do Trabalho julgar conflito de interesse relativo à relação jurídica entre representante e representada comerciais.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS UTILIZADAS
Não foram utilizadas referências bibliográficas.
FUNDAMENTOS DO VOTO DO MIN. LUÍS ROBERTO BARROSO
(VOTO VOGAL)
À Justiça do Trabalho compete processar e julgar ações sobre controvérsias relativas à relação de trabalho (art. 114, IX, CF).
A Lei n° 4.886/65 regula as atividades de representantes comerciais autônomos e, segundo seu art. 1º, a representação comercial é contrato típico e não existe vínculo empregatício entre representante e representado.
O art. 3° da CLT caracteriza as relações de emprego, elencando a subordinação como um de seus componentes. Conforme verificado na Lei nº 4.886/65, o serviço prestado pelo representante comercial não apresenta subordinação e o empregado, não sujeito ao empregador, tem autonomia para exercer a atividade.
A atividade exercida pelo representante comercial e empresarial é independente, segundo definição de Silvio de Salvo Venosa, e por isso não se configura nem como relação de emprego, nem como relação de trabalho.
Os elementos caracterizadores do contrato de representação comercial, dispostos pelo art. 27 da Lei n° 4.886/65, apresentam somente orientações gerais do representado ao representante, não alterando a situação de autonomia, diferenciando-se da subordinação trabalhista.
Como a representação comercial não é relação de emprego e nem mesmo de trabalho, seu regime, definido por legislação especial (Lei n° 4.886/65), não foi alterado pela EC n° 45/2004.
O art. 39 da Lei n° 4.886/65 dá competência à Justiça comum para julgar controvérsias entre representante e representado. Tendo estabelecido que a representação comercial não é relação de trabalho, não sendo abrangida pela EC n° 45/2004, a competência dada pelo artigo em questão prevalece e não viola o art. 114 da CF, por se referir a contrato típico, não a relação de trabalho.
A competência é definida com base na ação ajuizada. Sendo a causa de pedir relação jurídica regida pela CLT, o julgamento cabe à Justiça do Trabalho; não sendo, como é o caso do pedido de indenização por rescisão do contrato de representação comercial, cabe à Justiça comum. O pedido não é de natureza trabalhista.
A jurisprudência do STJ se dá nesse mesmo sentido (competência da Justiça comum em disputas sobre contrato de representação comercial autônoma com pretensão de receber importância relativa a serviços prestados).
Provimento do RE pois, sendo a relação comercial de natureza civil, sem vínculo trabalhista, de acordo com a Lei n° 4.886/65, o julgamento cabe à Justiça comum.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS UTILIZADAS
GOMES, Orlando. Contratos, 12ª ed. Rio de Janeiro: Forense.
REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. 23. ed. São Paulo: Saraiva. v. 1.
VARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 29. ed., São Paulo: Saraiva, 2004.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2014.
Elaboração de Juliana Scandiuzzi, com apoio da equipe do Observatório Trabalhista do Supremo Tribunal Federal.
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