O acórdão analisou a constitucionalidade do uso da taxa de referencial (TR) como índice de correção monetária dos créditos trabalhistas.
AÇÃO
ADC 58
TESE
Ação declaratória de constitucionalidade do uso da taxa de referencial (TR) como índice de correção monetária dos créditos trabalhistas.
ANDAMENTO
Julgamento de parcial procedência em 18/12/2020. Aguarda-se decisão de embargos de declaração. 19/02/2021: conclusos para o relator.
RELATOR
Ministro Gilmar Mendes
PARTE REQUERENTE
Confederação Nacional Do Sistema Financeiro - CONSIF
EMENTA
DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO DO TRABALHO. AÇÕES DIRETAS DE INCONSTITUCIONALIDADE E AÇÕES DECLARATÓRIAS DE CONSTITUCIONALIDADE. ÍNDICES DE CORREÇÃO DOS DEPÓSITOS RECURSAIS E DOS DÉBITOS JUDICIAIS NA JUSTIÇA DO TRABALHO. ART. 879, §7º, E ART. 899, §4º, DA CLT, NA REDAÇÃO DADA PELA LEI 13. 467, DE 2017. ART. 39, CAPUT E §1º, DA LEI 8.177 DE 1991. POLÍTICA DE CORREÇÃO MONETÁRIA E TABELAMENTO DE JUROS. INSTITUCIONALIZAÇÃO DA TAXA REFERENCIAL (TR) COMO POLÍTICA DE DESINDEXAÇÃO DA ECONOMIA. TR COMO ÍNDICE DE CORREÇÃO MONETÁRIA. INCONSTITUCIONALIDADE. PRECEDENTES DO STF. APELO AO LEGISLADOR. AÇÕES DIRETAS DE INCONSTITUCIONALIDADE E AÇÕES DECLARATÓRIAS DE CONSTITUCIONALIDADE JULGADAS PARCIALMENTE PROCEDENTES, PARA CONFERIR INTERPRETAÇÃO CONFORME À CONSTITUIÇÃO AO ART. 879, §7º, E AO ART. 899, §4º, DA CLT, NA REDAÇÃO DADA PELA LEI 13.467, DE 2017. MODULAÇÃO DE EFEITOS.
Decisão de parcial procedência para adotar como regra de correção dos débitos trabalhistas até que o legislativo adote outro índice. Na fase pré-processual, deve ser aplicado o IPCA-E e, a partir do trâmite processual, a taxa SELIC, que inclui correção monetária e juros, retirando a aplicação de juros de mora de 1% ao mês para os débitos trabalhistas.
OBJETO
Foi arguida a constitucionalidade da nova redação dos arts. 879, § 7º e 899, § 4º, da CLT, com a redação conferida pela Lei nº 13.467/2017 – Reforma Trabalhista e do art. 39, caput e § 1°, da Lei nº 8.177/1991.
APENSADAS POR PREVENÇÃO
ADC 59; ADI 5867; ADI 6021
PRINCIPAIS ATOS E PEÇAS DECISÓRIAS
ANDAMENTO COMPLETO http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5526245 RELATÓRIO PARA CIÊNCIA DAS PARTES (MIN. GILMAR MENDES) ------- PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÕES DO SENADO, EM 17/09/2018 http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=748260658&prcID=5526245# MANIFESTAÇÃO AGU, EM 26/09/2018 http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=748320012&prcID=5526245# MANIFESTAÇÃO PGR, EM 13/12/2018 http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=748942340&prcID=5526245&ad=s# MANIFESTAÇÃO PGR, EM 30/06/2020 http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=753162271&prcID=5526245# DECISÕES MONOCRÁTICAS 27/6/2020 Liminar deferida http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=753140036&prcID=5526245&ad=s# 1/7/2020 Julgamento dos embargos de declaração contra a liminar http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=753176084&prcID=5526245&ad=s# ACÓRDÃO http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=5526245
FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO (os fundamentos ora apresentados correspondem na íntegra ao resumo do acórdão)
O STF já reconhecera a inconstitucionalidade do art. 1°-F da Lei 9.494/1997, reconhecendo a insuficiência da TR para atualização monetária das dívidas do Poder Público, representando violação do direito de propriedade (ADIs 4.357, 4.425 e 5.348 e RE 870.947-RG - Tema 810). Logo, não se mostra adequada para atualização dos débitos trabalhistas;
O uso pelo TST do IPCA-E equiparava a natureza do crédito trabalhista com o crédito assumido pela Fazenda Pública de forma indevida, adotando este índice como substituição automática para a TR, sem fundamento adequado, na visão do STF;
O valor adequado para atualização dos créditos decorrentes de condenação judicial e correção dos depósitos recursais são os índices de correção monetária e de juros vigentes para as condenações cíveis em geral, definidos pelo art. 406 do CC, enquanto o art. 1°-F da Lei n° 9.494/1997, com a disciplina realizada pelo STF, aplica-se apenas para as dívidas da Fazenda Pública;
Na fase extrajudicial, deverá ser aplicado o IPCA-E, em razão da extinção da UFIR, e os juros legais previstos no art. 39 da Lei n° 8.177/1991. Por sua vez, na fase judicial, a atualização deverá ser realizada pela SELIC, que incide como juros moratórios dos tributos federais, o que limita a aplicação em conjunto com atualização monetária, pois representaria bis in idem.
Para efeitos de modulação, são válidos todos os pagamentos realizados com base na TR ou no IPCA-E, com juros de mora de 1% ao mês, bem como as sentenças em que houve trânsito em julgado que expressamente prevejam a aplicação deste índice, enquanto para os processos sobrestados, já se aplica a SELIC.
FUNDAMENTOS DO VOTO DO MIN. GILMAR MENDES (RELATOR)
Votou pela inconstitucionalidade da aplicação da TR para a correção monetária de débitos trabalhistas e de depósitos recursais no âmbito da Justiça do Trabalho. Entretanto, para o ministro Gilmar Mendes, deve ser utilizado, na Justiça do Trabalho, o mesmo critério de juros e correção monetária aplicado nas condenações cíveis em geral, de modo que devem ser utilizados na Justiça Trabalhista o IPCA-e, na fase pré-judicial, e, a partir da citação, a Taxa Selic. Fundamentos:
Critica o afastamento da incidência pelo TST da norma aprovada pelo Congresso Nacional, em violação da Súmula Vinculante 10 do STF.
Recuperação histórica das normas constitucionais e respectivas emendas sobre juros para concluir que “necessário que esta Corte, decorridos mais de 30 anos da promulgação da Constituição de 1988, passados tantos planos econômicos, bem como suas judicializações, reflita sobre os riscos de uma constitucionalização de normas do sistema financeiro e direito monetário, especialmente por meio de sua criação jurisprudencial”.
Cita Roberto Campos, na obra A CONSTITUIÇÃO CONTRA O BRASIL, abordando as “ilusões” de 1988: A ilusão da ilha da prosperidade; A ira indolor da inflação; - A ilusão transpositiva; - A ilusão distributiva.”
Sustenta que desde a criação da TR ela se voltava para correção e para juros: “Segundo Leonardo Medeiros Braghetto e Edmundo Emerson de Medeiros, a TR foi criada pela MP 294, com a finalidade de prefixar a taxa nominal de juros, sem refletir a inflação, para remunerar as aplicações financeiras. Com a conversão das MPs na Lei 8.177, a TR passou a ser utilizada como fator de correção monetária, adquirindo natureza dúplice (natureza de juros e índice), “ora a caracterizando como indexadora (art. 18) ora como taxa de juros (art. 39)”, levando Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque a conclusão de que a TR não desindexava a economia, apenas alterava o mecanismo de indexação”.
Conforme já tive a oportunidade de me manifestar em outros julgamentos, considero que o mais prudente seria deixar essa matéria no plano infraconstitucional.
A meu sentir, ainda que o STF tenha declarado a inconstitucionalidade da TR quando utilizada de forma retroativa ou nas relações entre administrados e a Fazenda Pública, o que acabou ocorrendo na seara trabalhista foi que o TST realizou uma verdadeira interpretação autêntica da jurisprudência do STF. Além de afastar a constitucionalidade da TR, a Corte Superior Trabalhista optou por substituir o legislador e eleger uma sistemática de atualização monetária, com a incidência de índice de correção monetária mais juros de mora, que não guarda compatibilidade com o nosso ordenamento jurídico.
Retoma a jurisprudência do STF sobre a TR para concluir que não houve declaração de inconstitucionalidade da TR em si, mas sim de sua aplicação retroativa, por respeito ao ato jurídico perfeito, e de sua aplicação às dívidas da Fazenda Pública, considerando que haveria quebra da isonomia a correção do débito da FP ocorrer por um índice menos favorável do que aquele que regia os seus créditos. Embora reconheça que “TR foi considerada insuficiente para a atualização monetária das dívidas do Poder Público inscritas em precatório, pois geraria violação ao direito de propriedade”.
Conclui: “A especificidade dos débitos trabalhistas, em que pese a existência de princípios como hipossuficiência do trabalhador, a meu sentir, teria o condão de estabelecer uma distinção clara que aparta as ações diretas em julgamento da controvérsia tratada nos precedentes envolvendo a Fazenda Pública”. Cita decisões turmárias nesse sentido.
Por fim, gostaria de salientar que, além de o STF não ter declarado a inconstitucionalidade da TR, per se, nos precedentes acima analisados, a verdade é que, em inúmeros julgamentos, o Tribunal manteve a norma válida, quer por não tê-la declarado inconstitucional, quer por não ter visto na demanda matéria constitucional.
Além disso, salvo nos casos de condenações impostas à Fazenda Pública, o que é mais importante: esta Corte não parece ter discutido com maiores detalhes qual deveria ser o índice de correção monetária utilizado em substituição à TR na hipótese de ser reconhecida sua inconstitucionalidade.
“Embora, como dito, o STF nunca tenha declarado a inconstitucionalidade da TR per se, reconheço que o entendimento majoritário da Corte tem indicado ou sinalizado a impossibilidade de utilização da TR como índice de correção monetária”. O relator ressalva seu entendimento em contrário, nessa parte, e se curva ao interesse da maioria, para concluir que a TR é inadequada para a correção do crédito trabalhista.
O que colocar no lugar? “entendo equivocado o raciocínio apresentado pela autora da ação direta, que espelha o posicionamento majoritário do TST, no sentido de que, para a atualização dos débitos trabalhistas, deveria incidir o IPCA-E mais juros de 1% ao ano.”
Segundo o relator, a solução adotada pelo TST, ao determinar a incidência do IPCA-E, não tem amparo legal, porque o relator do leading case invocado (Min. Fux) teria se referido exclusivamente à Fazenda Pública, ao qual não se equipararia o crédito trabalhista: “É que na decisão monocrática de lavra do Ministro Luiz Fux, o relator debruçava-se especificamente sobre a temática das repercussões de que o pagamento de precatórios federais parcelados na forma da EC 30/2000 ameaça a segurança jurídica e a proteção da confiança legítima, uma vez que a própria União, entre os anos de 2002 e 2011, interpretando o comando do art. 78 do ADCT, instituiu o pagamento de juros legais, em regime de capitalização simples, sobre cada parcela devida, a partir da segunda, consoante registrado nas leis de diretrizes orçamentárias vigentes em cada exercício financeiro”.
“Em termos bastante objetivos: não se pode, a pretexto de corrigir uma inconstitucionalidade, incorrer-se em outra. Valendo-se da técnica de interpretação conforme à Constituição, a proposta que trago à colação é a de que, uma vez afastada a validade da TR, seja utilizado, na Justiça Trabalhista, o mesmo critério de juros e correção monetária utilizado nas condenações cíveis em geral”.
Recorrendo a uma interpretação sistemática, o relator invoca a incidência do art. 406 do CCB, para determinar a aplicação da SELIC, que incide conjuntamente sobre correção monetária e juros de mora.
“Para que essa avaliação se realize em respeito à dogmática jurídica, proponho examinarmos – no plano concreto – as repercussões econômicas da utilização desse índice de correção vis a vis às de outros índices que têm sido utilizados para atualização dos créditos decorrentes de condenações trabalhistas conforme entendimento do TST e ainda os índices que orientam a atualização de créditos judiciais nas condenações cíveis em geral”.
Em seguida, compara uma tabela de apuração de débitos (correção monetária e juros de mora) para diferentes tipos de obrigações na Justiça Comum, conforme tema de recurso especial repetitivo nº 905, com a correção monetária e juros observadas na Justiça do trabalho, antes e depois da decisão do TST sobre a TR. Conclui que o TST passou a acumular a correção monetária via IPCA-E com juros de mora de 12% ao ano, o que tornaria o crédito trabalhista um crédito com “contornos extremamente vantajosos”.
Apresenta três possíveis cenários (1 – permanecer aplicando a TR; 2- passar a aplicar o IPCAE, acumulando com juros de mora de 1% ao mês como quer o TST; 3 – estabelecer um índice que contemplasse os dois elementos), indicando para a razoabilidade do terceiro: “Aplicar os mesmos índices de correção monetária e de juros vigentes para as condenações cíveis em geral, quais sejam a incidência do IPCA-E na fase pré-judicial e, a partir da citação, a incidência da SELIC. Essa opção consideraria que, diante da declaração total ou parcial de inconstitucionalidade da TR, dever-se-ia aplicar às condenações trabalhistas o art. 406 do Código Civil, que é utilizado nas condenações cíveis em geral”.
Em seguida, o relator se dedica a computar o impacto econômico que cada um dos cenários teria sobre os devedores trabalhistas, observando que a diferença do valor acumulado entre TR e IPCA implicaria um acréscimo de 25% ao crédito trabalhista, que ainda seria “exponencializada com a aplicação dos juros de mora no âmbito das condenações trabalhistas”. Faz outras estimativas de cálculos para cada cenário.
Invoca a pandemia como argumento para relativizar o impacto econômico da decisão: “Esse cenário de correção dos débitos trabalhistas piora, consideravelmente, na senda da atual pandemia do vírus “Sars-CoV-2” (Coronavírus), na qual a circulação de capital é sensivelmente diminuída e há retração econômica”.
“Portanto, para os críticos – de que estaríamos diante de institutos jurídicos diversos e inconfundíveis (correção monetária e juros) –, respondo que o Direito e seu intérprete não podem fechar os olhos para a realidade, sendo prova disso a jurisprudência de longa data do Supremo Tribunal Federal, que sempre tratou a condição inflacionária do país na análise da taxa de juros e vice-versa”.
“Sendo assim, posiciono-me pela necessidade de conferirmos interpretação conforme à Constituição dos dispositivos impugnados nestas ações, determinando que o débito trabalhista seja atualizado de acordo com os mesmos critérios das condenações cíveis em geral”.
Apela ao legislador para correção futura da questão.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS UTILIZADAS
Roberto Campos; Sérgio Fischer; Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque, Leonardo Medeiros BRAGHETTO, Edmundo Emerson MEDEIROS.
FUNDAMENTOS DO VOTO DO MIN. ALEXANDRE DE MORAIS
O Ministro acompanhou o relator, reconhecendo os fundamentos trazidos pelo Ministro Gilmar Mendes.
Reitera que o STF já reconhecera a impossibilidade, em julgamentos modernos, do uso da TR como índice de correção monetária, e concorda com sua inconstitucionalidade com o fundamento trazido no Tema 810, a RE 870.947, embora considere as hipóteses diversas.
A TR não permite a recomposição do poder aquisitivo e não capta a variação de preços na economia, de maneira que a preservação dos valores de créditos trabalhistas, de natureza salarial e alimentar, depende da recomposição da defasagem entre o valor nominal e o valor real da moeda, como proteção ao direito fundamental à propriedade.
Entendeu que a TR gera desequilíbrio na relação obrigacional entre credor e devedor, acarretando enriquecimento ilícito em favor do último em prejuízo ao direito de propriedade.
Concorda com a sugestão do relator sobre a aplicação dos mesmos critérios de juros e correção monetária utilizados em condenações cíveis com deferência à decisão do STJ no Tema 905.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS UTILIZADAS
Não utilizou referências bibliográficas.
FUNDAMENTOS DO VOTO DO MIN. ROBERTO BARROSO
O Ministro acompanhou o relator.
Retoma o histórico inflacionário, que marcou a história brasileira. Esse contexto de busca por estabilização monetária teve como base a responsabilidade fiscal, que embasou a Lei de Responsabilidade Fiscal e a Emenda do Teto de Gastos, discurso que entende ser desprovido de caráter ideológico.
No que toca à matéria monetária, enxerga que a atuação econômica do STF deve se pautar na autocontenção, razão pela qual o STF não deveria tocar no tema de correção monetária, que entende como infraconstitucional.
Reitera que a decisão em que o STF considerou que o uso da TR para correção de dívidas do Estado era inconstitucional se pautou numa questão de isonomia, pois a forma de correção quando o Estado era credor era distinta à aplicável ao Estado enquanto devedor.
Considera inadequado o critério do TST, que adota o IPCA-E em conjunto com juros de 1% ao mês, pois produz resultado muito superior à média do mercado, em sua visão. Dessa maneira, embora acredite que não se trata de matéria que deva ser discutida pelo STF, as desavenças sobre o tema demandam a intervenção por critério marcado pela maior razoabilidade, razão pela qual acompanha o Ministro Gilmar Mendes.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS UTILIZADAS
Não utilizou referências bibliográficas.
FUNDAMENTOS DO VOTO DA MIN. CARMEN LÚCIA
A Ministra acompanhou o relator.
Acredita que o Poder Judiciário deve se conter no tocante a esta matéria econômica considerando seus amplos impactos. Pontua que a justiça do trabalho afastou diversas vezes o índice legal e é fundamental que o STF decida para evitar a decomposição do poder aquisitivo e, ao mesmo tempo, para evitar o privilégio do crédito trabalhista.
Destaca que o STF já decidira sobre a aplicação da TR sobre o Sistema Financeiro da Habitação, e que no acórdão, o Ministro Moreira Alves realçou que a TR não foi criada com o propósito de refletir a inflação.
Desde setembro de 2017, a TR está estacionada m 0%, enquanto o IPCA-e variou em valor muito superior no período, e se considerados desde 2000, os índices possuem variações muito distintas. Conforme pesquisadores ressaltaram, a TR, por políticas econômicas e interferência governamental, tem sofrido influxos que a lançaram ao ostracismo.
No mesmo sentido, os precedentes do STF, em especial na ADI 4.425. Pontuou que a TR não é índice de correção monetária, sendo necessária a adoção de outros índices para correção dos valores nominais. Assim, conclui pela inconstitucionalidade da TR.
Entende que melhor seria se a matéria fosse tratada pelo legislador, mas dado o ingresso do STF na matéria, como nos casos anteriores, concorda com o entendimento do Ministro Gilmar Mendes.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS UTILIZADAS
HIGA, Flávia da Costa e BEBBER, Julio César. “Atualização Monetária dos Créditos Trabalhistas: Inconstitucionalidade da ‘TR’ e Utilização do ‘IPCA -E’” in Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região. Campo Grande. n. 20/2015.
FUNDAMENTOS DO VOTO DO MIN. EDSON FACHIN (DIVERGÊNCIA)
O Ministro Edson Fachin acompanhou o relator no sentido de afastar o uso da TR para a atualização das dívidas trabalhistas, contudo, abriu divergência no sentido de que o índice que deve ser utilizado é o IPCA-E, assim como o TST decidiu em 2015.
Ressalta os fundamentos do Ministro Moreira Alves na ADI 493 acerca da TR, considerando que a TR é produto da taxa média ponderada da remuneração de diferentes instituições financeiras e que compreende fatores econômicos vários que não têm relação restrita à troca de moeda. Retoma também o voto do Ministro Ayres Britto na ADI 4.357, que demonstrou a defasagem entre a TR e a inflação, o que afetava a eficácia da atividade jurisdicional.
Ressalta que débitos previdenciários, por exemplo, são atualizados pelo INPC, e que os valores das ações trabalhistas devem ser pagos sempre com o valor mais próximo do valor real.
No tocante à escolha do IPCA-E como índice substituto, fundamenta-a na melhor adequação à natureza dos créditos e depósitos laborais, conforme decidido na Arguição de Inconstitucionalidade n° 479-60.2011.5.04.0231. O ministro conclui, assim, pela integral procedência das ADIs n° 5.867 e 6.021 e pela improcedência dos pedidos das ADCs n° 58 e 59.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS UTILIZADAS
PRITSCH, Cesar Zucatti, JUNQUEIRA, Fernanda Antunes, MARANHÃO, Ney. Correção monetária de débitos trabalhistas: análise da recente decisão monocrática do STF no ARE 1247402, Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/321322/correcaomonetaria-de-debitos-trabalhistas-analise-da-recente-decisao Acessado em 25.08.2020.
FUNDAMENTOS DO VOTO DA MIN. ROSA WEBER (DIVERGÊNCIA)
A Ministra Rosa Weber seguiu o entendimento do ministro Edson Fachin, votando pela inconstitucionalidade da TR e a favor do uso do IPCA-E como índice de correção substitutivo da TR.
O surgimento da correção monetária para correção de débitos fiscais na Lei n° 4.357/1964, considerando o poder aquisitivo da moeda, e sua aplicação sobre débitos trabalhistas foi realizada por analogia à lei do inquilinato. Essa extensão jurisprudencial foi sedimentada pelo Decreto-lei n° 75/1966.
Na ADI 493, o STF já debatera a pertinência entre a TR e o conceito de correção monetária, apontando que a primeira refletia na realidade a rentabilidade do sistema financeiro. Seria, portanto, incapaz de refletir a desvalorização monetária, com caráter meramente remuneratório.
Ressalta voto do Ministro Fux na ADI 493, que ressaltou que o IPCA e o IPC, são índices que refletem as variações de preço e o fenômeno inflacionário, enquanto índices ex ante são incapazes de refletir tais variações.
Nos votos da ministra nas ADIs 4347 e 4425, ela destaca que buscou demonstrar a conexão entre os institutos da correção monetária e da proteção do direito de propriedade, como forma de sanar a mora para efetivação da decisão judicial e da coisa julgada.
Ante o exposto, acompanha o relator no que toca a inconstitucionalidade da incidência da TR, vez que a própria jurisprudência da casa já sedimentou a incompatibilidade entre a TR e a apuração da variação de preços na economia.
Quanto ao índice substituto, observa que diversos índices podem acompanhar as variações no custo de vida, como o INPC e o IPCA. Contudo, considera que o IPCA é mais amplo, cobrindo a cesta de produtos e serviços para 90% das famílias com rendimentos entre 1 e 40 salários mínimos.
Considerando-se a natureza alimentar do crédito trabalhista e o objetivo de resguardo do direito de propriedade e da coisa julgada, entende que o redimensionamento do valor nominal do crédito é melhor refletido pelo IPCA-E, conforme decidiu o TST, intérprete maior da legislação trabalhista e da CLT.
A MP 905/2019 determinou também a aplicação do IPCA-e e diferenciava juros moratórios, razão pela qual acompanha a divergência do Ministro Fachin.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS UTILIZADAS
SCAVONE JÚNIOR, Luiz Antonio. Do descumprimento das obrigações: consequências à luz do princípio da restituição integral, interpretação sistemática e teleológica. São Paulo: Editora Jurez Oliveira, 2007, p. 89.
FUNDAMENTOS DO VOTO DO MIN. RICARDO LEWANDOWSKI (DIVERGÊNCIA)
O Ministro Ricardo Lewandowski acompanhou a divergência aberta pelo ministro Edson Fachin, posicionando-se a favor do uso do IPCA-E.
Inicia seu voto pontuando a divergência no tocante ao posicionamento do Ministro Gilmar Mendes, enxergando a possibilidade de cumulação da correção monetária com juros de mora, reforçando a distinção entre estes institutos.
A recomposição do poder aquisitivo da moeda é direito subjetivo do credor do débito judicial, e deve ser cumprido sob pena de ofensa ao direito fundamental de propriedade. Defende que, desde a ADI 493, o posicionamento do STF sedimentou o afastamento da TR como fator de correção monetária, razão pela qual o TST acatou esse entendimento.
Pontua que o crédito trabalhista tem natureza alimentar e que o trabalhador tem seus direitos protegidos por cláusulas pétreas, reconhecendo-se sua posição de hipossuficiência. Debate, contudo, o discurso entre ajuste fiscal e demandas por um Estado Social, em especial no contexto da pandemia, acompanhada de pressões inflacionárias, destacando que o peso na contenção de gastos públicos não pode ser jogado sobre “as costas dos hipossuficientes”.
Acompanha, dessa maneira, os fundamentos do Ministro Edson Fachin.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS UTILIZADAS
Não utilizou referências bibliográficas.
FUNDAMENTOS DO VOTO DO MIN. MARCO AURÉLIO (DIVERGÊNCIA)
O Ministro Marco Aurélio acompanhou a divergência aberta pelo ministro Edson Fachin e afirmou que não há a menor dúvida da inconstitucionalidade da TR, que contempla juros da mora e atualização da moeda.
Destaca que as discussões e as ações estão centralizadas em torno da correção monetária e o uso da TR, e que o enunciado n° 20 do Conselho da Justiça Federal indica que o uso da taxa SELIC para apuração dos juros legais.
Reforça ainda o dispositivo do CTN que prevê juros de mora de 1% e que a discussão deve estar adstrita à correção monetária. Reputa a TR completamente inconstitucional na recomposição do poder aquisitivo da moeda.
Acompanha o voto divergente para reconhecer a inconstitucionalidade da TR, e entende que o IPCA-e serve como melhor fator para refletir a inflação.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS UTILIZADAS
Não utilizou referências bibliográficas.
FUNDAMENTOS DO VOTO DO MIN. NUNES MARQUES
O Ministro acompanhou o relator.
STF já firmou entendimento da ausência de recomposição monetária pela TR, não somente pela isonomia, mas por sua inadequação como índice de correção monetária. Embora o legislador possa editar novas normas sob a mesma estrutura da antiga, não sana sua desconformidade com a Constituição Federal.
Os Tribunais Trabalhistas têm interpretado a inconstitucionalidade da TR nos termos do Tema 810 do STF, contudo, pontua que na decisão do STF não se tratava de débitos trabalhistas, e a justiça trabalhista realizou aplicação excessivamente ampla.
O tempo de tramitação do processo envolve elementos não característicos do período extrajudicial, tendo em vista que há um aspecto institucional da necessidade de persecução em juízo do débito. Assim, considera possível a aplicação de distintos índices nos momentos anteriores e posteriores ao ajuizamento da ação.
A correção monetária não deve produzir em valores absolutos o índice de inflação. Uma correção monetária ideal deve ser inferior à taxa de inflação: a correção é uma espécie de “redoma” contra distúrbios no setor monetário, mas deve evitar que distúrbios de outros setores da economia que afetam a inflação e não têm natureza monetária sejam incorporados, pois gerariam distorções no momento da correção.
IPCA-e mede a inflação de um conjunto de bens e serviços, ligado ao consumo real de famílias, apto portanto à aplicação extrajudicial. Por sua vez, na tramitação do processo, enquanto não houver lei sobre o tema, deverá ser aplicada a taxa SELIC, pois a mora não pode ser atribuída ao devedor, e sim aos mecanismos legais de efetivação pelo Judiciário de direitos.
O legislador pode instituir correção monetária mais favorável, contudo, o Judiciário não pode se utilizar lógica empresarial e negocial para substituir os termos da relação. A proximidade das relações trabalhistas com relações cíveis impõe a aplicação subsidiária do Código Civil, conforme art. 8° da CLT. O art. 406 do CC é norma de amplo alcance, sendo apta a substituir a TR enquanto índice de correção ante a inconstitucionalidade desta.
Ressalta a decisão do STJ de que a SELIC serve como juros moratórios aplicáveis sobre os débitos do FGTS (Tema 99). Destaca também o Tema 102 do STJ que reconhece SELIC como índice de correção monetária e de juros moratórios. Por essa razão, concorda com o relator que a correção no período judicial deve se assemelhar ao aplicado em condenações cíveis.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS UTILIZADAS
CONTADOR, Cláudio Roberto. O efeito realimentador da correção monetária, disponível em PPE_v7_n_3_O Efeito.pdf (ipea.gov.br).
FUNDAMENTOS DO VOTO-VISTA DO MIN. DIAS TOFFOLI
Acompanhou o relator. Ressalta que há uma convergência do STF acerca da inadequação da Taxa Referencial como critério de atualização monetária, restando a divergência na indicação do índice a ser aplicado em substituição.
A proteção do direito fundamental à propriedade erigido no art. 5°, XII da CF impõe a manutenção da equivalência na relação entre credor e devedor, e conforme precedente do STF nas ADIs 493/DF e 4.357/DF, a TR não é apta a refletir a variação no poder aquisitivo da moeda.
A natureza alimentar dos créditos da Justiça do Trabalho torna essencial a atualização do débito pela recomposição do montante depreciado pela inflação, e a inviabilidade da TR cria lacuna a ser suprida pelo legislador.
Contudo, não reconhece fundamento legal que autorize a aplicação do IPCA-e, como o TST tem realizado, de modo que não cumpre ao STF preencher esta lacuna. Inclusive, pontua que existem outros índices que refletem a variação dos preços na economia, como o IGP-M, o INPC e o IPC, cumprindo ao legislador realizar a opção política por um índice.
Para suprir essa lacuna, concorda com a referência do Ministro Gilmar Mendes à regra de atualização das condenações cíveis. Nesse sentido, destaca a interpretação do Superior Tribunal de Justiça que o art. 406 do Código Civil se refere à taxa SELIC.
Embora alguns critiquem o uso da SELIC, por ser definida pela expectativa de inflação, enquanto parte de política econômica e monetária, o Ministro faz sua defesa da SELIC. Segundo o ministro, as objeções a SELIC não autorizam afastar a opção feita pelo legislador. Destaca a jurisprudência no RE n° 582.461 que autoriza a incidência da SELIC para atualização de débito tributário, e que a SELIC é utilizada para correção de débitos tributários federais desde a edição da Lei n° 9.065/1995.
Como pontua o ministro, a SELIC incorpora tanto os juros moratórios quanto a correção monetária, de maneira que impede a aplicação de outros índices de atualização em conjunto, o que resultaria em bis in idem.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS UTILIZADAS
FONSECA, Rodrigo Garcia da. Os Juros e o Novo Código Civil. Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais, vol. 26, p. 67 – 110, Out - Dez / 2004 LOUREIRO, José Eduardo. Os Juros no Novo Código Civil. Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo, vol. 11, p. 94 – 105, Jan - Jun / 2003.
LIVROS, ARTIGOS E OUTRAS PRODUÇÕES CIENTÍFICAS
PORTO, Noemia. O STF e as surpresas em decisões monocráticas. Estadão. Disponível: https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/o-stf-e-as-surpresas-em-decisoes-monocraticas-seguranca-juridica-para-que/
* Impedido o Ministro Luiz Fux.
** Aguarda-se decisão sobre embargos declaratórios.
Elaborado por Pedro Rizzo, com apoio da equipe do Observatório Trabalhista do Supremo Tribunal Federal.
Commentaires